Passou a ser uma ofensa pessoal dizer que está tudo bem com você.
Vivemos dias em que as palavras estresse e cansaço fazem parte do nosso vocabulário cotidiano.
É quase uma obrigação confessar que as coisas estão difíceis, que não temos mais tempo para nada, que só encontramos seres egoístas, preocupados com sua satisfação pessoal.
Acredito que estamos distorcendo a realidade, pintando-a com cores mais sombrias só para nos colocarmos um pouco acima da média, em se tratando de quantidade de dramas.
Jamais tivemos tanta liberdade para expressar e realizar desejos pessoais. Não é esse campo em que o problema se situa, mas na nossa incapacidade para perceber que as cobranças muitas vezes partem de nós mesmos. Excesso de rigidez pode nos impedir de ver o quão felizes somos.
Eu faço parte da turma dos contentes. Não preciso de grandes projetos ou grandes motivações para me dar conta de que estou bem e de que tudo pode ficar melhor ainda. Meus anseios costumam ser modestos e de curto prazo. Quando não dão certo, resisto ao pensamento de que estou sendo vítima de algum complô e muito menos de que não vale a pena tentar de novo.
Dificilmente alguém me encontrará abatido, a não ser que alguma dor física se aposse de mim.
Acordar é ter a minha frente um imenso palco onde posso encenar um drama ou uma comédia, a escolha quase toda vez é minha.
Claro que alguns enredos mais tristes nos surpreendem independente da nossa vontade. Mas, convenhamos, seria muito chato viver permanentemente no paraíso.
Precisamos de umas sacudidas até para perceber o que há de bom e não somos capazes de perceber.
Na medida em que aprendemos a diminuir nossas expectativas, em que pequenas doses de alegria nos suprem, não é difícil encontrar razões para um bem-estar que nem sempre passa pelo senso comum.
Talvez haja, sim, um excesso de preocupação em preencher as horas, fazendo e sentindo tudo com intensidade exagerada.
Corre-se de um lado para outro, sobrepondo ações, encontros, compras, passeios.
Sinto uma tendência a recuar quando isso acontece, pois essa sobrecarga nos torna mais queixosos do que normalmente somos.
O que chamamos de plenitude pode ser o resultado de um ato de esvaziamento, não de acúmulo.
Poucas coisas são mais terapêuticas do que liberar gavetas, abrir espaços, rasgar papéis.
Soaria falso propor uma fórmula para se chegar a esse estado de contentamento.
Vamos deixa-la nas mãos dos professores de autoajuda.
Prefiro traçar um itinerário que nasce a partir da observação cuidadosa do que me acontece.
Folhear as páginas de um livro, sentar-me ao lado de um amigo que precisa que o escutem, espreguiçar os olhos e ser banhado por uma manhã de sol. Não posso transferir o grau de satisfação que sinto com isso, ele pertence unicamente a mim.
O bom é descobrir que para esses prazeres não é preciso da validação de ninguém, eles simplesmente acontecem como uma consequência natural da minha disponibilidade.
Se diminuo as queixas, provavelmente me tornarei mais agradável e a convivência não será mais um fardo.
Nem para mim, nem para os outros.
As ruas estão tomadas por pessoas tensas, que correm de uma loja para outra, comprando, trocando, namorando objetos.
Explodimos os limites dos cartões de créditos só para colocar mais uma quinquilharia dentro de casa.
A expressão do afeto precisa passar sempre por um presente que dou ou recebo.
Um belo gesto, sem dúvida, mas que muitas vezes traduz apenas uma obrigação, não uma vontade.
O meu roteiro de felicidade inclui: não ir a festas chatas só para não magoar quem as promove, gastar o mínimo possível para ganhar mais tempo sem fazer nada, respeitar a privacidade e a liberdade dos amigos, avisando quando pretendo visita-los, ligar pelo menos uma vez por semana para quem gosto, não comer frituras, descansar depois do almoço aos sábados e domingos, não ter vergonha de dizer que está tudo bem comigo.
A lista é pessoal, mas leva em conta que talvez não haja para nós uma segunda chance ou um exame de recuperação. Nos meus lábios crepita a palavra agora.
O texto não é meu, é de Gilmar Marcílio, mas repasso para reflexão.
Forte Abraço, Paz e Muiiita Luz...
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