quarta-feira, 27 de julho de 2011

Um Trem Solitário...


     O sofrimento é uma viagem solitária e o destino é desconhecido até, pelo menos, metade da jornada.
Não é que não existam anjos no caminho. A solidão acontece nos momentos que eles precisam descansar e seguir suas próprias estradas. Minha viagem é dentro de um trem silencioso. Em algumas estações, alguns anjos aparecem para me amparar, mas, em seguida, preciso embarcar de novo. Em todas as estações, tenho um em especial sempre me esperando.

     Neste trem, a companhia constante é o som dos trilhos e do vento; a cada estação, assentos são preenchidos por borboletas de variadas cores que me passam a sensação de querer transmitir uma mensagem. Meu primeiro assento é o número 2006. Quando a dor aperta muito, uma nova estação aparece e o alívio vem dos braços de mais anjos. Quero ficar pela segurança e pelo apoio, mas a natureza me impulsiona a seguir viagem.

    Volto ao trem e, entre centenas de assentos vazios, escolho outro mais próximo da janela, o número 2011. No meio da noite, meu grito, que é abafado pelo vento, vem em forma de uma pequena frase: por que o trem está vazio? Na insônia, decido passar de vagão em vagão na esperança de encontrar companhia. A única luz que vejo está na frente, lá na frente, como se fosse à luz no fim do túnel.
    
     Enquanto cruzo todos aqueles vagões, borboletas me seguem e formam um círculo, querendo estabelecer comunicação. Não há primeira classe. Há correntes que parecem algemas segurando todos os vagões. Sento-me para descansar. A intensidade da dor me anestesia e durmo com uma canção de ninar feita pelo vento e, quando sinto frio, as borboletas se transformam em um belo lençol colorido, pousando suavemente sobre meu corpo. Agora, existe apenas o som do silêncio, passando de vagão em vagão, e um cheiro doce de um imenso laranjal.
       No meio da noite, acordo soluçando e gritando “por que esse vazio?”. No desespero, começo a chorar e, ao fechar meus olhos, percebo a aproximação de mais borboletas que tocam minha face de forma quase imperceptível. É como se viessem em super câmera lenta. Em segundos, elas se transformam em um lenço, muito colorido, enxugando meu rosto ao sugarem as lágrimas. Uma pousa na minha boca abafando o grito. Quando a solidão chega à minha mente, é como se elas soubessem e se aproximam fazendo um círculo de proteção. São dezenas, centenas, milhares de borboletas naquele trem. De todas as cores, tamanhos e beleza.
        Mais uma estação e mais encontros com mais anjos. Já é quase metade da jornada e começo a analisar minha vida por todos os ângulos. É na metade do caminho que entendo um pouco do doutorado oferecido pela universidade da vida. A mais profunda pesquisa é pessoal e qualitativa.
             Subo mais uma vez no trem da vida. Agora, consigo abrir as janelas e sentir o cheiro do mato e das laranjas, o som dos pássaros; sinto a brisa tocar no meu rosto e seguir boca adentro para acalmar suavemente minha alma.
       A medida que a viagem prossegue, as estações começam a ter mais anjos. Mas o que mais me intriga é que o trem continua vazio, a não ser pela invasão das borboletas que insistem em fazer contato comigo, mas não consigo compreender a mensagem. Elas bailam na minha frente, fazendo um verdadeiro espetáculo da natureza.
        A medida que a viagem segue, e o trem diminui a velocidade, percebo que algumas borboletas começam a me seguir pelo lado de fora, passando uma mensagem que elas precisam “entreter” outros viajantes necessitados. Mas ainda tenho muitas dentro dos vagões. Estou sentado e vejo pela janela que uma nova estação se aproxima.
       Lentamente o trem vai parando, parando, parando até parar. Seria a estação final? Seria meu destino? Deveria descer e ficar? Por que esse trem para se ninguém desce e ninguém sobe nele? Que mensagem tem essas paradas e essas estações? Observo que as borboletas começam a sair lentamente e voam em minha direção pelo lado de fora. De repente, um silêncio me invade e, de olhos fechados, reflito sobre toda a viagem. Encosto minha cabeça na janela, agora sem vento. Por que tantos bancos vazios?
       De repente, sinto um leve toque no meu ombro esquerdo, tão suave que continuo com os olhos fechados. Mais um suave toque e percebo alguém muito especial ao meu lado. Pergunto-lhe: por que estive tão sozinho? Com um sorriso, responde-me com outra pergunta: e o maquinista não conta, Claudemir?
       Sai lentamente e, antes de descer, lança um olhar e outro sorriso. Retira as correntes para deixar os vagões livres. Eu acompanho cada passo e vejo que se junta a outros anjos que também levam correntes. Saem lentamente em busca de outros trens, outras estações. Eu continuo sentado com meu rosto colado, grudado na janela e pensando na frase: e o maquinista não conta, Claudemir? A medida que acenam e se distanciam, começo a dormir. 
       No sono profundo, vem o sonho. Quando sonhamos, entendemos a linguagem das borboletas. Elas invadem meu quarto. A mais jovem, que acabara de passar pela metamorfose, me passa essa mensagem através das batidas de suas asas: a cura da dor, muitas vezes, está na própria dor. Faz parte das leis da natureza.
       Nossa viagem solitária é necessária. No silêncio do casulo, nos privamos de julgamentos, construímos nossas asas e nos preparamos para o grande voo. Nem sempre boas intenções contam, pois podem representar o corte de nossas asas. No inverno, as árvores ficam mudas e solitárias enquanto suas raízes, também mudas, se enterram em mais de sete palmos abaixo do solo, em busca de vida para nos dar flores e frutos por gerações.
      Tudo acontece em profunda solidão. A vida é uma viagem com várias estações com escadas para podermos subir e descer. A vida é uma viagem que só faz sentido se houver aprendizado entre uma estação e outra. Punição é voltar a estação anterior. Correção é chegar a próxima estação.
      A parada é para reflexão do passado, correção do presente e completa transformação do futuro. A próxima estação deverá sempre ser a melhor parada. Assim deverá caminhar a humanidade. Evolução é um caminho lindo e sem volta. O trem da vida nos espera para seguirmos adiante. A metamorfose positiva acontece durante a viagem.
      No final do sonho, todas as borboletas me cercam e a mais experiente delas fica frente a frente comigo. Ela quer saber se tenho mais alguma dúvida. Repeti a mesma pergunta feita quando ainda estava no trem: por que estive tão sozinho? E a resposta, mais uma vez, é uma pergunta: e o maquinista não conta, Claudemir?
      *Claudemir Oliveira

* É presidente do Seeds of Dreams Institute, jornalista, pós-graduado em Marketing (ESPM) e Comunicação (ESPM), mestrado e doutorando em Psicoterapia (EUA), com foco em Psicologia Positiva. É membro vitalício da Harvard University e referência internacional em Psicologia Positiva. Vive em Orlando desde 2000. Contato: www.seedsofdreams.org

       
      A Vida é isso mesmo... Muitas vezes estamos acompanhados e nos sentimos “Sozinhos”... Este texto fala sobre solidão, mas fala também sobre outras tantas coisas como; Metamorfose ou transmutação ou ainda transformação e mudanças talvez... A pergunta que nos falta as vezes é: E o maquinista, não conta???
      Sem dúvida alguma, isto é necessário à todo Ser Humano, faz parte de nossa evolução.
      Forte Abraço, Paz e Muiiita Luz...




“Tudo o que tenho visto ensina-me a confiar no criador de tudo o que eu não vi.”  Ralph Waldo Emerson
            
 

       

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